Dividida em 13 partes,
acompanhada de muitas imagens e cronologia dos principais fatos da história
russa a obra Os Russos, de Angelo
Segrillo, é um importante estudo sobre os povos russos e a sua cultura, fazendo
parte também da coleção de livros dessa mesma editora que tratam de alguns povos
específicos, como os Americanos, Portugueses e Japoneses.
O autor, especialista em estudos russos pela Universidade de São Paulo, diz na introdução algumas das
características e curiosidades da Rússia, como suas muitas riquezas naturais e
o jus sanguinis (direito de sangue).
Segundo Angelo Segrillo
Morei muitos anos na Rússia. Primeiro cursei o mestrado no Instituto Pushkin de Moscou, ainda nos
tempos da União Soviética. Depois por períodos de longa duração de pesquisa nos
arquivos da Rússia pós-soviética como historiador especializado naquela região
do mundo. O relato deste livro é fruto, então, não apenas das leituras
acadêmicas, como também da vivência e contato pessoal com os russos, em seu
ambiente (SEGRILLO: 14).
Em Quem são os russos, capítulo introdutório e guia do livro, o autor
discute a nacionalidade russa, baseada na ideia de sangue, diferente, portanto,
do caso brasileiro. O sangue pode ser, nesse caso, entendido como cultura, como
a produzida pelos seres humanos (WILLIAMS, 1992).
Em O maior país do mundo é problematizado uma característica
geográfica da Rússia; sua divisão entre Europa e Ásia, que se reflete em
algumas confusões quanto à definição da identidade aos seus povos. São
destacados alguns superlativos russos: sua enorme área coberta de gelo, maior
reserva de florestas, nove fusos horários, maior exportador mundial de
minerais, madeira e energia.
Das antigas repúblicas soviéticas destacam-se os
países bálticos (Letônia, Lituânia e Estônia), as três repúblicas consideradas
quentes e ensolaradas (Geórgia, Armênia e Azerbaijão), países com comuns
origens (Romênia e Moldávia), as cinco repúblicas muçulmanas localizadas na
Ásia central (Cazaquistão, Uzbequistão, Turcomenistão, Tadjiquistão e
Quirguistão), além de outras nacionalidades que convivem dentro e fora do
território russo, como a Chechênia.
Em A cultura russa o autor aponta que os russos são um povo adepto da
leitura, principalmente na época soviética, devido ao subsídio maior no custo
do material impresso; apresenta-nos também os muitos elementos que se somavam
pra construção da Rússia atual, como os vikings (COSTA, 2012). São também apontados
vários autores em língua russa como Mikhail Lomonosov, Nikolai Karamzin,
Aleksandr Pushkin, Dostoievski, Tolstoi, Anton Tchekhov, Maiakovski, e
escritoras como Anna Akhmatova e Marina Tsvetaeva; além de muitos outros
escritores conhecidos mundialmente. A academia de artes russa foi fundada em
1757, que por extensão impulsionou artistas como Ilya Repin, Mikhail Vrubel,
Mikhail Nesterov, Vladimir Burlyuk, Kazimir Malevich, assim como vários
movimentos artísticos. Assim como a arte, o cinema russo é considerado
revolucionário, e alguns de seus produtores são conhecidos mundialmente, como
Sergei Eisenstein, Aleksandr Dovjenko, Pudovkin e o criador da primeira escola
de cinema no mundo; Lev Kuleshov. A música era em épocas passadas onde o povo
russo, grandes músicos das cordas, canalizavam seu talento.
Em Como pensam, comem, vivem e se divertem os russos o autor mostra
que os russos tem sua alimentação ligada ao seu rigoroso frio russo. Nos
esportes despontavam principalmente na época soviética, pois em momentos
específicos, como nas Olimpíadas, conseguiam rivalizar com seu maior
adversário: os Estados Unidos. Os russos tem um equivalente ao carnaval
brasileiro; o maslenitsa, uma festa
de origem pagã. O sistema familiar russo se assemelha ao brasileiro, pois os
jovens ficam mais tempo em casa se comparado ao padrão estadunidense. A
educação russa é uma das mais desenvolvidas do mundo, onde praticamente todos
são alfabetizados. As mulheres enfrentam uma situação próxima do ocidente: elas
ganham menos e trabalham mais, mesmo tendo maior tempo de estudos.
Na parte As origens e a cristianização é afirmado
que o estado russo teve suas origens não na própria Rússia e sim na região de
Kiev, na Ucrânia. Ainda que seja de difícil definição a origem russa na Crônica Primária Russa é mostrado que o
estado russo foi fundado com a ajuda (solicitada e atualmente velada) dos
vikings, embora nem todos aceitem essa versão. Na expansão pelo ocidente e
oriente, é salientado que na Rússia o cristianismo teve características
próprias, se separando do que era praticado no ocidente, como o cristianismo
ortodoxo, que prima por suas formas mais originais. Posteriormente, no período
soviético era pregado o ateísmo, mas com algum grau de liberdade religiosa.
Em Conquistada e conquistadora é mostrado que a Rússia foi dominada
por um longo período, do século 13 a 15 pelos mongóis, que segundo defendem
alguns autores atrasou o estado russo em relação ao que estava ocorrendo no
ocidente. São apresentadas duas formações mais antigas: a Rússia czarista considerada
uma confederação de estados bem diferentes e a Rus’ kievana, com forte
centralização política.
Em A Rússia e o ocidente o autor levanta qual o grau de relação entre
a Rússia e ocidente, passando por fases que às vezes a aproximavam, e às vezes
se diferenciavam dessa parte do planeta, como no governo de Pedro, o Grande, e
Catarina II, convencidos do atraso russo e da modernidade dos países do
ocidente. É destacada também a Intelligentsia,
ou seja, o chamado grupo de pessoas, que havia cursado faculdade ou curso técnico
e que praticavam algum tipo de trabalho “mental”, na chamada época do
iluminismo russo.
Em O período pré-revolucionário a Rússia começa a ganhar maior prestígio
no exterior após os reinados de Pedro e Catarina. É mostrada a armadilha que os
russos imprimiram aos franceses ao tentarem invadir o território russo nas
guerras napoleônicas, como a baixa de 600 mil soldados franceses em Moscou. São
destacados outros conflitos, como a guerra da Criméia e os muitos conflitos
entre Rússia e Turquia. São mostradas as revoluções russas, como a de 1905, que
pretendia mudar uma nação sem partidos políticos, constituição ou leis formais,
sendo abortada por ser fortemente reprimida. São apresentadas algumas causas
que impulsionaram a Rússia em sua revolução de 1917 (a de fevereiro e outubro),
como a concentração de operários em grandes fábricas e a liderança de figuras
de destacado peso político, como Lenin e Trotski.
O capítulo Os meandros da Revolução Russa continua
a ideia do capítulo anterior, ao afirmar na proposta revolucionária que a
Revolução Russa teve frente a um capitalismo que enfrentava problemas. O autor
questiona sobre se no ano de 1917 o que aconteceu teria sido um golpe ou
revolução, afirmando que a resposta foi ao mesmo tempo um pouco dos dois. A
guerra civil de 1917 a 1921 devastou a Rússia, agora aberta para ser
reconstruída por duas formas de economia: ou a de mercado (capitalismo) ou o
socialismo (coletivação), optando no final das contas em um sistema misto,
através da política instituída por Lenin através do NEP. Por volta de 1937, no
fim do segundo plano quinquenal, a Rússia já era a segunda maior potência
industrial do mundo, rivalizando com os Estados Unidos (BARRACLOUGH, 1976). Na
década de 1920, destacam-se as lutas políticas entre algumas figuras que
participaram da Revolução de 1917 como Stalin, Trotski, Bukharin e Lenin.
Em Sob Stalin é estudado o crescimento russo nas décadas de sua
administração, como o impressionante crescimento russo ao custo de muito
esforço humano num regime muito rígido. É destacada pelo autor a revolução
cultural dos anos 1930, pouco estudada no ocidente e o trauma nacional dos 27
milhões de mortos russos durante a Segunda Guerra Mundial. Nesse período devido
à convocação de vários setores da sociedade russa para a guerra, foi dada uma
maior abertura política no país. Mais uma vez arrasada em uma guerra mundial, no
início da década de 1950 a Rússia consegue ser novamente a segunda potência
industrial do mundo (HOBSBAWN, 1995).
Em Acomodação do sistema após a morte de Stalin fica um vazio em sua
sucessão presidencial, ficando, no fim das contas Nikita Krushchev, vinculado
ao círculo político de Stalin, mas de conduta política menos rígida. Krushchev
e Brezhnev começaram a chamada coexistência pacífica com os Estados Unidos, um
de seus maiores rivais. Alguns momentos destacam-se como o lançamento do
primeiro satélite artificial no espaço (Sputnik
,1957), o primeiro ser humano no espaço (Yuri Gagarin, 1961) e a Crise dos Mísseis
(1962).
Em O fim da URSS o autor chama a atenção para o governo de Mikhail
Gorbachev, último chefe do estado soviético, que traria uma reforma no sistema
do país, como a Perestroica, inclusive
ao ser um dos governantes mais novos que estavam em vigência. A troca de uma
economia fortemente centralizada aos poucos vai dando espaço a outras forças de
cooperação, como as empresas privadas. No começo de 1990 cai o regime
soviético, após sete décadas de domínio no leste europeu e influência de um
terço dos países no mundo.
Em Os russos embarcam no capitalismo a antiga União Soviética cede
lugar a 15 novos países no final de 1991. Boris Yeltsin governa desastradamente
agora a Federação Russa e é sucedido por Vladimir Putin na década de 2000, que
teve três mandatos presidenciais, apenas interrompidos pelo aliado Dmitri
Medvedev. É começado o maior programa de privatização do planeta na década de
1990, que gerou inflação e desemprego em todo o país.
Em Os russos e o Brasil o autor mostra que, apesar de Brasil e Rússia
serem dois gigantes poucas vezes estiveram
próximos, como expresso em seus diferentes regimes políticos e econômicos ao
longo de suas histórias. Cooperações econômicas aconteceram nos governos
contemporâneos dos dois países, como no simbolismo do primeiro brasileiro no
espaço patrocinado pela agência espacial russa. São levantados outros pontos,
como a maior imigração russa ao Brasil no século 20, a influência de membros da
Igreja Ortodoxa no território nacional e de alguns conhecidos brasileiros de
origem russa.
Na Conclusão o autor aponta que a história dos russos é um capítulo a
parte desse país, baseado principalmente da preferência dos russos entre o
sistema capitalista e o sistema socialista, tema ainda em aberto.
Em suma, o autor examinou a história russa tendo por base tanto o
olhar acadêmico quanto a própria experiência pessoal da época que viveu na
Rússia, sendo que as muitas características desse país, como aspectos físicos e
geográficos, cultura, história, etnias, língua e arte, entre outros pontos, sendo,
portanto, uma importante e profícua fonte quanto a cultura russa.
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
· BARRACLOUGH, Geoffrey. Introdução
à história contemporânea. Rio de Janeiro: Zahar. 1976.
● COSTA, Fabio Antonio. A história dos vikings em periódicos de
história do Brasil. Disponível em: www.historiaehistoria.com.br.
● HOBSBAWN,
Eric. A Era dos Extremos: O breve
século XX. São Paulo: Companhia das Letras. 1995.
· SEGRILLO, Angelo. Os
Russos. São Paulo: Contexto. 2012.
· WILLIAMS, Raymond. Cultura. Rio de Janeiro: Paz e Terra.
1992.
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